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10/03/2011 |
Moção de censura ao Governo - crise, austeridade, EVT |
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Intervenção da Deputada Heloísa Apolónia
- Assembleia da República, 10 de Março de 2011 -
1ª Intervenção
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, não é, certamente, motivo para o felicitar, mas o senhor foi o Primeiro-Ministro sujeito ao maior número de moções de censura. Isso não o fará reflectir?
Mas vamos lá para fora, vamos sair da Assembleia da República e vamos pensar se o Sr. Primeiro-Ministro, porventura, não terá já reparado que os portugueses têm passado a vida a contestá-lo, a censurá-lo, a protestar contra as suas políticas, em lutas muito concretas: em benefício da sua qualidade de vida; contra a política do Governo; por linhas ferroviárias e pelo seu direito à mobilidade…
O Sr. Primeiro-Ministro ri-se…!
Muitos portugueses lutam por centros de saúde e pelo seu direito à saúde; lutam contra o encerramento das escolas e pelo seu direito à educação. Várias, várias manifestações por este País fora, de norte a sul… Uma greve geral, brutal!, que já reclamou contra as políticas deste Governo.
De facto, este Primeiro-Ministro fez com que muitas pessoas — e algumas anunciaram-no, inclusive, publicamente —, que não participavam em formas de protesto desde o 25 de Abril, o fizessem. Sim, este Primeiro-Ministro levou-as para a rua! Isso não o fará reflectir? Jovens, que nunca participaram em formas de protesto, participam, agora, por via da garantia de um futuro melhor. Isso não o fará reflectir? O País protesta contra o Governo. Isso não o fará reflectir? Isso não o perturba, Sr. Primeiro-Ministro?
E como é que o Primeiro-Ministro de Portugal qualificará isto? Como candidato, antes das eleições, o senhor chegou aos órgãos de comunicação social e disse: eu não aumentarei os impostos, mas, chegado ao Governo, a primeira coisa que fez foi aumentar os impostos.
Como se qualificará uma pessoa que diz que vai abrir um concurso para professores contratados, mas, passado um tempo, diz que não, que não vai abrir concurso para professores contratados, ficando todas as expectativas desses professores goradas?
Como se qualificará uma pessoa que diz ao País: eu vou criar 150 000 postos de trabalho e só num ano liquida 100 000 postos de trabalho?
Como se qualifica uma pessoa que, antes das eleições, enquanto candidato, mas já Primeiro-Ministro, aumenta os apoios sociais, mas assim que ganha as eleições corta os apoios sociais anunciados? Como é, Sr. Primeiro-Ministro? Como é que se qualifica esta pessoa?
O Sr. Primeiro-Ministro já qualificou aqui tanta gente, já adjectivou… Aliás, hoje, é só adjectivos, adjectivos… Mas, então, como é que qualifica isto?
O Sr. Primeiro-Ministro naquela reunião que teve com a Sr.ª Merckel foi dizer — nós aqui, em Portugal, ouvimos, Sr. Primeiro-Ministro — que é subserviente ao povo português… O Sr. Primeiro-Ministro quer explicar essa expressão ao povo português? Mas que subserviência é esta?
Sabe, Sr. Primeiro-Ministro, o senhor, há pouco, disse uma coisa interessante. Disse: nós, exigirmos aos nossos bancos mais do que os outros?! Não, não pode ser! Ah, pois é, mas às pessoas, aos portugueses o senhor exige mais do que os outros exigem… Olhe para os baixos salários, olhe para a nossa qualidade de vida, olhe para o sustento de vida que estas pessoas têm, os nossos salários são os mais baixos da Europa! Não me diga que nunca deu por nada!…
É que aquelas pessoas que perderam o abono de família sabem que são elas as vítimas destas opções políticas; aquelas pessoas que não têm subsídio de desemprego, pese embora estejam no desemprego, sabem que são elas as vítimas desta política; aquelas pessoas que perderam as bolsas de estudo sabem que são vítimas desta política; aquelas pessoas a quem cortaram os salários sabem que são as vítimas desta política, porque o Governo está a obrigá-los àquele objectivo, já maquiavélico, da redução ou da obsessão com o défice. Mas à banca não, ao sistema financeiro não pede, não pede nada, nem aquela taxa adicional ainda pediu! Lá para o final do ano, talvez…! Não é, Sr. Primeiro-Ministro? Aqueles 0,001%…
Sr. Primeiro-Ministro, eu acho que isto, de facto, já é mesmo brincar com o País. O Sr. Primeiro-Ministro tem de tirar essa capa, porque o Sr. Primeiro-Ministro nos discursos fala muito, faz muitos equívocos, engana muito, porque esta é a palavra: engana muito. Mas, Sr. Primeiro-Ministro, os portugueses já perceberam a realidade com que estão confrontados e as opções políticas com que estão confrontados e o que o País está a pedir é que mude de rumo, Sr. Primeiro-Ministro. Mude o rumo! Entenda que não dá para aguentar mais!
2ª Intervenção
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Julgo que o Sr. Primeiro-Ministro tem de ter mais respeito por quem trabalha, porque um Primeiro-Ministro que não respeita quem trabalha está votado ao fracasso.
Não sei se o Sr. Primeiro-Ministro se deu bem conta do que disse, hoje, sobre os professores de EVT. Começou por se dirigir à bancada do PSD, dizendo que em vez de se andarem a preocupar com a Matemática e o Português, andam a preocupar-se com EVT. Isto não se diz, Sr. Primeiro-Ministro! Isto é um profundo desrespeito pelo ensino da criação e pela criação artística.
Agora pode dizer que não, mas disse, porque está gravado!
O que o Sr. Primeiro-Ministro acabou por dizer é que aquela gente, aquele par pedagógico de EVT, não anda a fazer nada, anda a passear com as crianças. Isto não se diz, Sr. Primeiro-Ministro!
Talvez fosse importante o Sr. Primeiro-Ministro — como, aliás, alguns Deputados desta Casa — ir também assistir a uma aula de EVT para perceber exactamente o que lá se faz! Trata-se de aprender a conhecer e aprender a fazer, a criar, a saber fazer.
Não, Sr. Primeiro-Ministro! Recordo que se reduziram, dos trabalhos manuais e da educação visual, de três para dois professores. É que isto não é o ensino do Português nem é o ensino da Matemática, nem se ensina como a Matemática, que é claro que são muito importantes. Tem uma aprendizagem distinta, Sr. Primeiro-Ministro! Julgo que os professores de EVT terão de fazer uma «defesa da honra» mas estarão, naturalmente, à altura de a fazer para o Sr. Primeiro-Ministro.
Também quero dizer que o Sr. Primeiro-Ministro não respondeu a Os Verdes sobre o que quis dizer na Alemanha com a subserviência ao povo português. E não foi por acaso que não disse. Nem «piou» sobre a matéria! Porquê? Porque não é subserviente ao povo português. O Primeiro-Ministro de Portugal e o Governo português são subservientes à Alemanha e aos mercados financeiros. Isso, o Sr. Primeiro-Ministro não pode dizer, não é politicamente correcto, mas é a realidade.
Portanto, não vá lá para a Alemanha dizer coisas porque também as ouvimos em Portugal, Sr. Primeiro-Ministro, e depois é grave porque os portugueses sentem isso de uma forma muito diferente.
O Sr. Ministro das Finanças está a «dançar», não sei se ao som… Mas, enfim, tudo bem…
Entretanto, Sr. Primeiro-Ministro, mesmo para terminar, quero dizer-lhe — e, já agora, por falar do Sr. Ministro das Finanças — que há coisas que arrepiam.
Arrepia quando ouvimos, no mesmo dia, o Sr. Ministro das Finanças e o Sr. Primeiro-Ministro anunciarem aos portugueses que farão tudo o que for preciso para atingir os seus objectivos. O que é que isto quererá dizer?
Que se for preciso mais medidas de austeridade, cá estarão eles — aqueles dois, e mais, este Governo — para apresentar mais medidas de austeridade. Adivinha-se sobre quem podem cair? Sobre os mesmos! E o sistema financeiro cá andará, a gerar os seus lucros, na sua boa vida, porque eles não o atacam.
E é isto que não pode ser, Sr. Primeiro-Ministro! O País anda farto! E o grande pedido que os portugueses fazem — e Os Verdes, naturalmente, também o fazem — é que mude de rumo para, em vez de recessão, fazer crescer este País, económica e socialmente.