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17/02/2011 |
Problemas nas eleições presidenciais com cartão de cidadão |
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Intervenção da Deputada Heloísa Apolónia
- Assembleia da República, 17 de Fevereiro de 2011 -
1º Pedido de esclarecimento
Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, em nome do Grupo Parlamentar Ecologista «Os Verdes», quero saudá-lo pela sua declaração política, que julgo ser bastante pertinente face às questões que se colocam em relação ao último acto eleitoral.
Sr. Deputado António Filipe, concordo perfeitamente com o que disse relativamente à precipitação da aprovação pelo Governo de uma proposta para a eliminação do número de eleitor. De resto, como o Sr. Deputado bem disse, o Sr. Ministro da Presidência, em comissão parlamentar, também corroborou a necessidade de não haver precipitação, mas parece-me perfeitamente clara a razão pela qual o Governo o faz.
O Governo precisa de desviar as atenções em relação a esta matéria face àquilo que ainda nos falta apurar ou, aliás, àquilo que vai sendo apurado paulatinamente e de uma forma muito clarividente.
O Sr. Deputado já referiu — e em comissão parlamentar isso ficou bem demonstrado — que, provavelmente, a Sr.ª Secretária de Estado da Administração Interna faltou à verdade aos Deputados, pelo que precisamos de saber se assim foi de facto.
A Sr.ª Secretária de Estado disse que proferiu um despacho para que a notificação fosse feita aos cidadãos que alteravam o seu local de voto para que soubessem do seu número de eleitor e do seu local de voto. Ora, diz a Sr.ª Secretária de Estado que essa notificação não foi feita por responsabilidade única e exclusiva do Director-Geral da Administração Interna e que só soube do incumprimento do despacho no dia das eleições. Mas o ex-Director-Geral da Administração Interna, entretanto demitido, vem dizer que «não senhor, a Sr.ª Secretária de Estado sabia atempadamente e antes das eleições que o despacho não estava cumprido».
Ora, como é que ficamos perante isto? O Governo quer esquivar-se à sua responsabilidade, porque não quer assumir responsabilidades políticas, mas já percebemos que elas existem. E têm de ter consequências.
Na nossa perspectiva, a eliminação do número de eleitor serve para desviar atenções, mas convém que o Parlamento não se desvie do que é central, que é o apuramento da verdade em relação ao drama que se passou no dia 23. Sim, porque é um drama as pessoas quererem exercer o seu direito fundamental de votarem e não poderem.
O Sr. Deputado também levantou outra questão extraordinariamente importante, relativa ao mapa oficial dos resultados eleitorais. E quero realçar que só Os Verdes e o PCP, na CNE, votaram contra esta aberração. Todos os outros aceitaram que ela fosse para a frente, o que não me parece curial nem tão pouco compreensível.
De facto, o mapa oficial dos resultados eleitorais relativos às últimas eleições presidenciais não corresponde ao que se passou. No distrito de Setúbal perderam-se, não se sabe como!, 120 000 eleitores, mais de 50 000 votos; no distrito de Viseu aparecem, sabe-se lá como!, mais 40 000 eleitores e mais de 20 000 votos. Mas o que é isto?!
Sr. Deputado, desculpe a expressão que vou utilizar, mas isto é uma «palhaçada» autêntica, e o sistema democrático não se coaduna com este tipo de apuramentos.
É necessário ir tão atrás quanto possível para perceber onde é que se errou para apurar a verdade. Não podemos conformar-nos com este tipo de apuramentos, com este tipo de actas, de relatórios, seja lá o que for, que nos transmitam como verdade aquilo que não corresponde à verdade.
E podíamos estar, de facto, numa situação muito complicada caso os resultados eleitorais tivessem sido outros. Ainda assim, a situação é extremamente preocupante e requer o apuramento da verdade, sendo para isso que apelamos.
2º Pedido de esclarecimento
Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Macedo, nesta situação, em concreto — e dada a gravidade da mesma —, do mapa oficial do apuramento eleitoral, de facto, o que devia ter acontecido era que a Comissão Nacional de Eleições não devia ter aceitado aquilo que veio do Tribunal Constitucional, porque ninguém consegue compreender o que é que se passou, de facto!
De resto, devo relembrar que, na Comissão Nacional de Eleições, só Os Verdes e o PCP votaram contra essa matéria.
Independentemente dessa alteração, que agora o PSD vem aqui anunciar, sobre esta situação em concreto, considero que isto é extraordinariamente grave, e que é preciso recuar, até onde for necessário, para se perceber onde residiu o erro e tentar corrigi-lo. Ou, então, pergunto o seguinte: o que é que vamos fazer? A acta foi feita, foi publicada e vamos esquecer o erro? Foi cometido, fica registado, fica para a História…?
Considero que isto é demasiado grave e que requer, de facto, essa correcção. O Tribunal Constitucional não agiu bem e a Comissão Nacional de Eleições também não. E é preciso rectificar e ir até onde for preciso. Julgo que a nós, como Deputados, também nos cabe fazer essa reclamação e solicitar essa correcção.
Depois, Sr. Deputado, relativamente à matéria do cartão de cidadão e do número de eleitor, não sei se o Sr. Deputado teve oportunidade de atender bem àquilo que o Sr. Deputado Francisco de Assis disse aqui ainda há pouco, e que era aquilo que o Governo e o Partido Socialista gostavam que acontecesse.
Então, foi assim: foi encomendado um estudo à Universidade do Minho; o estudo veio; a Sr.ª Secretária de Estado e os Srs. Ministros esclareceram aquilo que tinham a esclarecer; demitiu-se o Director-Geral da Administração Interna — está tudo resolvido!
E mais: o Governo ainda dá mais um passo, que é o de eliminar o número de eleitor. Pronto, assunto completamente arrumado! Foi mais ou menos essa, a expressão utilizada pelo Sr. Deputado Francisco de Assis.
Só que querem tapar, completamente, os olhos àquele que foi todo um processo decorrido, designadamente na Assembleia da República.
É porque o estudo da Universidade do Minho é uma coisa extremamente sumária!… E tanto assim é que, no final de Março, princípios de Abril, veio um estudo mais completo — foi porque esse não estudou tudo aquilo que tinha para estudar.
Mas este estudo — foi reconhecido, de resto, por todos os membros, julgo, da 1.ª Comissão — comete, até, um erro, que é o de atribuir responsabilidade aos cidadãos por não terem, antecipadamente, tomado, por sua iniciativa, conhecimento do número de eleitor, quando aquilo que todos sabemos é que houve um compromisso e declarações públicas por parte do Governo, designadamente no próprio dia das eleições, a dizer que aquilo não custava nada: na hora, os cidadãos teriam essa informação.
E os cidadãos ficaram convictos de que o sistema lhes daria essa resposta, mas não deu!
Portanto, a culpa não foi de «os cidadãos não terem atempadamente»…! «Atempadamente», eles solicitaram, só que não obtiveram a resposta, atempadamente, sobre o número de eleitor.
Mas o Partido Socialista continua também a ignorar que a Sr.ª Secretária de Estado garantiu à Assembleia da República que não tinha tido conhecimento do incumprimento do despacho para obrigação da notificação aos cidadãos eleitores.
E a Sr.ª Secretária de Estado também garantiu que só teve conhecimento desse desrespeito no dia das eleições, mas, na verdade, aquilo que já se apurou publicamente é que não: a Sr.ª Secretária de Estado soube antes…!!
Pergunto, pois: o que fazemos sobre esta matéria? Fechamos os olhos ou continuamos a apurar responsabilidades? E continuamos a apurar a responsabilidade política, que o Governo e o PS não querem encontrar, mas que é, de facto, necessário encontrarmos, em abono da verdade e do próprio direito dos cidadãos ao exercício do seu voto para que estas questões não se repitam…
Termino, mesmo, Sr. Presidente, dizendo que, de facto, esta questão da eliminação do cartão de eleitor é uma «fuga para a frente», mas nós precisamos de perceber muito aquilo que vem de trás.