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17/09/2010 |
Projecto de lei n.º 167/XI do PEV - Estabelece quotas de emprego público para vítimas de violência doméstica |
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Intervenção da Deputada Heloísa Apolónia
- Assembleia da República, 17 de Setembro de 2010 -
1ª INTERVENÇÃO
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados:
Os Verdes trazem, mais uma vez, à Assembleia da República a temática da violência doméstica.
Não vamos abordá-la muito em pormenor, até porque temo-lo feito noutras alturas em que o debate se tem promovido na Assembleia da República e o tempo hoje é curto; qualquer forma, sempre é importante lembrar que estamos perante um drama da sociedade portuguesa e que todos os anos ouvimos falar das dezenas de mulheres que morrem vítimas de violência doméstica — 20, 30, 40… Todos os anos somos assolados com estes números, para já não falar dos milhares e milhares de mulheres a quem é roubada a sua dignidade por via do problema que enfrentam diariamente.
Os Verdes batalharam muito aqui, na Assembleia da República, para a concretização das casas-abrigo para vítimas de violência, mas, infelizmente, ano após ano, em sede orçamental, apesar de apresentarmos propostas que visam o reforço de verbas necessárias à implementação destas estruturas, a verdade é que essas propostas não têm sido aprovadas e temos ainda hoje grande carência desta rede pública que, como sabem, não cobre todo o País.
Mas aquilo que Os Verdes apresentam hoje, na Assembleia da República, prende-se com uma questão concreta que tem a ver com o seguinte: há muitas mulheres vítimas de violência doméstica que se sujeitam à continuidade desta barbaridade, porque têm dependência económica, não têm forma de se sustentar a si e, muitas vezes, aos seus filhos e, porque estão dependentes economicamente do agressor, muitas vezes, acabam por não ver outra saída senão a da continuidade desta agressividade.
Ora, aquilo que Os Verdes consideram é que o Estado não deve fechar os olhos a esta realidade e, apesar de entendermos que esta não é a solução para o problema, ela é uma solução, porque este problema não tem uma solução milagrosa — senão, provavelmente, já a teríamos encontrado! —, mas temos de ir pegando em várias perspectivas de solução que, juntas, contribuirão para atacar esta barbaridade que vivemos na nossa sociedade.
Então, aquilo que propomos é que o Estado dê o exemplo e crie uma quota de empregabilidade pública para vítimas de violência doméstica que tenham, naturalmente, todos os requisitos que enquadramos a nível do nosso projecto de lei e que, em cada cinco lugares de concursos externos, um seja dedicado, digamos assim, a pessoas nestas condições.
Nós já temos algumas quotas de emprego público na nossa legislação, designadamente ao nível de pessoas com deficiência, e a lógica é mais ou menos a mesma, ou seja, encontrar uma quota destinada a estas mulheres, quota, essa, que pode ou não ser preenchida em função da procura.
Finalmente, gostaria de dizer que lamentamos as declarações da Sr.ª Secretária de Estado para a Igualdade em torno da apresentação deste nosso projecto de lei, porque a Sr.ª Secretária de Estado, de uma forma profundamente insensível, veio dizer que a dependência económica não é o problema das mulheres vítimas de violência. Ora, em nosso entender, esse é também o problema e se este projecto de lei de Os Verdes viesse resolver o problema a 2, 5 ou 10 mulheres nós já considerávamos que ele tinha sido profundamente útil.
É este o contributo que Os Verdes, hoje, pretendem dar.
2ª INTERVENÇÃO
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero, em primeiro lugar, agradecer a atenção que todas as bancadas dedicaram a este projecto de lei de Os Verdes e manifestar a importância do facto de todas as bancadas terem reconhecido que a dependência económica das mulheres em relação ao agressor, a sua falta de autonomia financeira é uma condição bárbara para a continuidade da sujeição ao crime de violência doméstica. Este é um ponto de partida extraordinariamente importante, porque tem de nos fazer reflectir, também nesta base, como noutras, para encontrar soluções. E foi uma solução para essa problemática que Os Verdes aqui trouxeram, hoje, à Assembleia da República.
Não vou responder a todos os Srs. Deputados pormenorizadamente, até porque o tempo de que disponho não mo permite; de qualquer modo, há algumas questões suscitadas que me parecem merecer uma reflexão por parte de Os Verdes.
O Sr. Deputado Mendes Bota suscitou a questão de o projecto de lei ser extemporâneo, porque, agora, as quotas de admissão na função pública estão congeladas. Mas, Sr. Deputado, essas quotas estão congeladas porque o PS e o PSD assim o entenderam! E, já agora, também pergunto: isso é para sempre, Sr. Deputado? Não há-de ser e, portanto, não estou a ver em que é que o nosso projecto possa ser extemporâneo, já que não pretende ser transitório.
Disse também que não existe em mais nenhum país. Está bem, Sr. Deputado, mas também há soluções que existem noutros países e não existem em Portugal! Nós não estamos proibidos de encontrar soluções inovadoras e que possam assegurar-se como resposta concreta a estas mulheres pelo facto de não existirem noutros países. Isso não é problema para nós! Estamos numa realidade concreta, com uma sociedade concreta, com crimes concretos relativos à nossa sociedade, e é à nossa sociedade que temos de dar resposta.
A Sr.ª Deputada Manuela Augusto suscitou a questão da operacionalidade, digamos assim: «então, e se as senhoras não têm habilitações?». Ó Sr.ª Deputada, como é evidente, estas mulheres também teriam de se sujeitar às regras do concurso. Então, isto não se passa já nas quotas das pessoas com deficiência, Sr.ª Deputada?! Como é que se resolve? Resolve-se! E porquê? Porque há vontade para resolver. Quando não há vontade para resolver é que se começam a encontrar todos esses mistérios e todas essas coisas que parecem não ter solução mas que, de facto, têm solução.
Depois, a Sr.ª Deputada diz também que estas vítimas já têm preferência na sua transferência. Mas são as que trabalham, Sr.ª Deputada! Estamos a falar aqui de outra realidade, a das mulheres que não têm emprego, que não têm autonomia financeira e não têm como sobreviver! É dessas mulheres concretamente que o projecto de Os Verdes fala.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os Verdes continuarão com certeza, no decurso desta Legislatura, a apresentar soluções para contribuir para a erradicação do crime bárbaro que é a violência doméstica.