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19/05/2010 |
Projecto de Lei n.º 266/XI - Institui o Tributo Solidário |
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Intervenção do Deputado José Luís Ferreira
– Assembleia da República, 19 de Maio de 2010 -
Sr. Presidente, Senhoras e Senhores Deputados,
O PSD apresenta-nos hoje para discussão um projecto de Lei, que pretende estabelecer o Tributo Solidário. Trata-se, a nosso ver, de uma designação interessante, mas quando nos debruçamos sobre o seu conteúdo, o que vemos é um projecto que de solidário não tem nada.
Obrigar os desempregados a trabalhar gratuitamente, é ofender quem, enquanto trabalhou, também descontou para a possibilidade dessa situação poder vir a acontecer. E se tivermos em consideração que o quadro normativo hoje em vigor sobre a matéria, permite já o recurso ao trabalho socialmente necessário, mas remunerado, e no caso do subsídio de desemprego, como se sabe, há um valor adicional de 20% da prestação, então o que se pretende com este projecto, nada mais é do que remover a natureza remuneratória, ainda que parca, ao trabalho socialmente necessário prestado pelas pessoas que estão sem trabalho.
Ou seja, em bom rigor, o que se pretende com este Projecto de Lei é que o trabalho comunitário obrigatório deixe de ser reembolsado, nem mais nem menos. Para o efeito prevê o Projecto que os desempregados com direito a subsídio de desemprego, porque, como sabemos metade dos desempregados em Portugal, nem sequer direito têm a subsídio de desemprego, mas os que têm, ficariam obrigados a prestar serviço à comunidade em instituições públicas ou do sector social durante 15 horas semanais, distribuídas por 3 dias úteis, tornando assim obrigatória a prestação do tal tributo solidário.
Os beneficiários do Rendimento Social de Inserção, por sua vez, ficariam obrigados a assinar o acordo para a prestação de actividade socialmente útil, que implicaria a prestação de 20 horas semanais por quatro dias úteis. Quem recusasse perderia o direito ao subsídio, e não teria sequer acesso ao Rendimento Social de Inserção.
Portanto, penalizações e castigos para os desempregados que se portassem mal, que se recusassem injustificadamente a assinar ou não cumprissem o acordo. E só razões de saúde ou assistência familiar inadiável e imprescindível, tornaria justificável a recusa de tal tributo.
Os desempregados incumpridores só poderiam voltar a pedir subsídio após a constituição de um novo prazo de garantia e sem direito a Rendimento Social de Inserção. Os beneficiários de Rendimento Social de Inserção que se recusassem ou incumprissem, ficariam dois anos sem direito à prestação.
É difícil de compreender esta fúria contra os desempregados, como se fossem eles os responsáveis por não terem trabalho e como se fossem esses cidadãos os grandes responsáveis pela crise que atravessamos.
“Os Verdes” não acompanham, nem de longe, nem de perto, o PSD na pretensão de colocar as pessoas desempregadas a trabalhar gratuitamente. É grande a distância que nos separa, na forma de encarar o subsídio de desemprego.
Para nós o subsídio de desemprego não é uma dádiva, uma esmola ou uma benesse que o Governo dá às pessoas que estão actualmente sem trabalho, mas sim, um direito pago pelos próprios, que, enquanto trabalharam, muitos deles durante muito tempo, para alem dos impostos que pagaram, também descontaram para a Segurança Social, para adquirirem esse direito, que por isso mesmo lhes pertence, porque compraram essa triste situação, mas que é de qualquer forma um direito.
Essas pessoas, todos os meses, enquanto trabalharam descontaram 5,22% dos seus salários para, na eventualidade de ficarem sem trabalho, terem o direito a receber o respectivo subsídio de desemprego.
Trata-se de uma espécie de seguro cujo prémio é pago antecipadamente para o caso de haver um acidente, no caso, a perda de trabalho, tendo depois o direito a receber uma determinada importância que, neste caso, é o subsídio de desemprego.
Já não é pouco estar sem trabalho, mas em 2006, o Partido Socialista modificou as regras de atribuição do subsídio de desemprego, procedendo à diminuição dos períodos de atribuição e introduzindo um novo conceito de emprego conveniente.
Como resultado deste Diploma, e com a precariedade a alastrar ao ritmo que se conhece, uma parte significativa desses cidadãos desempregados, ficaram excluídos do acesso ao subsídio de desemprego.
Já não é pouco estar sem trabalho, mas pior quando, para além disso, o Governo não procede a aumentos nos apoios sociais em 2010, levando os magros rendimentos dessas pessoas a distanciarem-se, cada vez mais da Retribuição Mínima Garantida.
Já não é pouco estar sem trabalho, mas assistir a novos apertos nas regras para ter acesso ao subsídio de desemprego, primeiro pela via do Pacto de Estabilidade e Crescimento, depois na sequência do acordo entre o Partido Socialista e o PSD, torna as coisas ainda piores.
Face a todos estes ataques, faltava só esta proposta do PSD que pretende obrigar as pessoas que estão privados se trabalhar, a faze-lo gratuitamente, como se fosse o Governo a dar-lhe uma dádiva, mas não, eles descontaram, compraram esse direito com os seus salários, pior, viram-se obrigados a beneficiar desse subsídio.
A nosso ver, é no mínimo humilhante para essas pessoas, que são os mais atingidos por uma crise sobre a qual não têm qualquer responsabilidade, obriga-los a trabalhar gratuitamente.