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02/06/2010 |
Proposta de lei n.º 26/XI (1.ª) — Aprova um conjunto de medidas adicionais de consolidação orçamental que visam reforçar e acelerar a redução de défice excessivo e o controlo do crescimento da dívida pública previstos no PEC |
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Intervenção do Deputado José Luís Ferreira
- Assembleia da República, 2 de Junho de 2010 -
1ª INTERVENÇÃO
Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, esta proposta que o Governo nos traz hoje para discussão, com medidas adicionais ao Pacto de Estabilidade e Crescimento, é uma espécie de «PEC 2», não considerando nesta contabilidade o Orçamento do Estado para 2010, pois, nesse caso, seria o «PEC 3», já que tanto o Orçamento do Estado como o PEC, primeira versão, e agora este diploma o que pretendem é exactamente a mesma coisa, ou seja, a consolidação orçamental, a redução do défice e o controlo do crescimento da dívida pública.
Os objectivos, os considerandos, são exactamente os mesmos, como, aliás, são os mesmos os sacrificados, são os do costume, os de sempre. Fazendo-se, no conjunto — Orçamento do Estado para 2010, Pacto de Estabilidade e Crescimento e proposta de lei que o Governo agora aqui nos traz —, um ponto da situação em termos de sacrifício, ele poderia ser traçado assim: alargamento das penalizações para os reformados; mais restrições e mais limitações no acesso às prestações sociais, sobretudo no acesso ao subsídio de desemprego; fortes ofensivas aos serviços públicos, fragilizando em muito a qualidade dos serviços prestados aos cidadãos; restrições cada vez mais apertadas no acesso à Administração Pública, contribuindo assim para continuar a adiar o problema que mais preocupa os portugueses, que é o problema do desemprego; congelamento dos salários, acentuando a perda do poder de compra da generalidade dos portugueses; e agora também o aumento dos impostos, do IRS e do IVA, isto apesar de o Sr. Primeiro-Ministro ter dito nesta Assembleia, há poucas semanas, que não haveria aumento de impostos.
Ora, face a este cenário, não há dúvida de que estamos perante um claro e acentuado desequilíbrio do sacrifício para fazer face à crise ou, como o Governo gosta de dizer, para devolver a confiança aos mercados financeiros e aos seus agentes.
Até parece, Sr. Ministro, que o Governo apenas governa para os mercados financeiros e para os seus agentes, como se os cidadãos não existissem. É que, de facto, não se compreendem as resistências do Governo em, pelo menos, procurar o mínimo de equilíbrio no sacrifício que devia ser repartido por todos, e é exactamente sobre esta matéria que gostaríamos que o Sr. Primeiro-Ministro nos esclarecesse.
Não considera que seria oportuno e justo, Sr. Ministro, que a proposta que o Governo nos traz aqui hoje determinasse a suspensão, pelo menos até 2013, de todos os benefícios fiscais actualmente concedidos em sede de IRC ao sistema bancário e aos grandes grupos económicos, considerando até os fabulosos lucros que, mesmo em tempos de crise, continuam a apresentar? É que os portugueses não entendem os motivos que justificam a continuação destes benefícios fiscais quando se pedem sacrifícios a todos.
Depois, Sr. Ministro, não acha que esta também seria uma boa oportunidade para que a banca pagasse uma taxa de IRC igual àquela que é paga pelas pequenas e médias empresas portuguesas?
Por fim, Sr. Ministro, gostaria que me explicasse qual o período de vigência desta proposta de lei. Sabemos que ela prevê um conjunto de medidas adicionais ao PEC e também sabemos que o PEC tem validade até 2013, mas não foi votado nesta Assembleia. Trata-se de uma proposta de lei que não fala sobre a sua vigência, o PEC não foi votado nesta Assembleia e queria que o Sr. Ministro nos explicasse qual o período de vigência desta proposta de lei.
2ª INTERVENÇÃO
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: As medidas adicionais de consolidação orçamental que o Governo nos propõe através desta proposta de lei vêm, na perspectiva de Os Verdes, agravar o desequilíbrio no que se refere ao sacrifício que por todos devia ser suportado.
Quando seria de esperar que, finalmente, o Governo alargasse o sacrifício aos bancos e aos grandes grupos económicos, nomeadamente com a suspensão dos benefícios fiscais em sede de IRC, mas também com a necessidade de colocar o sector da banca a pagar uma taxa de IRC igual às à das pequenas e médias empresas portuguesas, as medidas que constam da proposta do Governo não passam por aí, mais uma vez passam ao lado.
Quando seria finalmente de esperar que o Governo procedesse à introdução de uma taxa sobre as transferências para paraísos fiscais, uma medida que, aliás, já há muito se reclama, sobretudo hoje com a crise, mais uma vez as medidas não passam por aí.
Ou seja, as medidas agora propostas pelo Governo vêm exactamente no mesmo sentido e visam os mesmos destinatários que as medidas do Pacto de Estabilidade e Crescimento e as de contenção do Orçamento do Estado para 2010, deixando de fora os do costume, desde logo a banca e os grandes grupos económicos.
Com esta proposta do Governo, continua a imoralidade e a injustiça fiscal, que obriga aqueles que menos responsabilidades têm na criação e no galopar da crise que vivemos a assumir os encargos e a suportar os custos e as consequências desta crise, deixando de fora aqueles que mais responsabilidades têm na situação e que continuam, apesar de tudo, a ganhar com ela.
Os Verdes vão, portanto, votar contra a proposta do Governo e contra as medidas adicionais de consolidação orçamental que lhes dão conteúdo.
As restantes iniciativas legislativas em discussão, propostas pelo Bloco de Esquerda, a nosso ver, representam um contributo importante para repor algum equilíbrio no que diz respeito ao sacrifício que deve ser partilhado por todos e vamos, portanto, votá-las favoravelmente.